Quanto mais tempo passa desde a eleição de João Lourenço como Presidente da República, mais pessoas parecem querer falar sobre o antigo chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos. Nas ruas de Luanda, até as crianças querem dar entrevista, para falar sobre ele.
Emanuel Chumbo, um rapaz de 13 anos acompanhado do pai numa bicicleta, diz que sabe onde está José Eduardo dos Santos: “Está em Espanha. Já é [altura de ele regressar], porque essa altura não é mais para ficar no país dos outros”, declara ao microfone da DW África.
Como Emanuel, outros residentes da capital angolana também notam o sumiço do antigo Presidente e pedem para ele voltar.
“Já era tempo de ele regressar”, afirma Abel Sebastião, de 22 anos. “Já está há um bom tempo lá, também tem que passar um bom tempo aqui. Quanto terminar o seu tratamento, tem de regressar”, opina o cidadão.
José Eduardo dos Santos deslocou-se a Barcelona, em Espanha, em abril do ano passado, para um exame de rotina, e nunca mais voltou a Angola. Há quem especule que não seja apenas por motivos de saúde que o ex-Presidente não tenha regressado ao seu país – os escândalos de corrupção e de má governação associados ao seu mandato também estariam a servir de travão a Eduardo dos Santos.
Espanha, afirmam alguns, serviria como uma espécie de “exílio” para o ex-Presidente. Mas, para o jurista Manuel Pinheiro, José Eduardo dos Santos não tem motivos para se sentir desconfotável em Angola. “José Eduardo dos Santos […] não é perseguido em Angola”, pontua.
Relegado ao “banco de trás”
Mas, com José Eduardo dos Santos fora do país, os novos líderes parecem estar a relegar o ex-Presidente para o banco de trás. “Por exemplo, se vamos hoje às instituições do Estado, você repara que nós encontramos dois retratos: o retrato do primeiro Presidente da República de Angola, o Dr. António Agostinho Neto, e a imagem do general João Lourenço, o atual Presidente de Angola”, comenta o politólogo angolano David Sambongo.
“O que transparece é que parece que houve uma vacatura durante este período de 1979 até 2017. Não é correto”, avalia.
No âmbito das comemorações dos 45 anos de independência, foram colocados cartazes nas ruas de alguns bairros de Luanda com fotografias dos antigos Presidentes de Angola. Mas a iniciativa gerou controvérsia, porque a imagem de José Eduardo do Santos, o homem que durante 38 anos liderou o país, não constava nos cartazes.
Esta semana, o partido no poder, o MPLA, demarcou-se da ação, sublinhando que “o engenheiro José Eduardo dos Santos, Presidente Emérito do MPLA, ocupa um lugar privilegiado na história de Angola” e do partido.
A ascenção e consolidação de JLo
Eduardo do Santos completa, na sexta-feira (28.08), 78 anos de vida. Se ainda estivesse no poder, a data seria certamente celebrada com atividades culturais e desportivas, como a famosa “Taça do Presidente”. Mas agora já não se fala em festejos, comenta o cidadão Ricardo André.
“Nos anos passados, começando mesmo já no início de agosto, já se veria várias maratonas. Mesmo o aniversário do atual Presidente não é comemorado como o aniversário do ex-Presidente”, conta.
Entretanto, João Lourenço consolida cada vez mais o seu poder no seio do MPLA e do aparelho de Estado. Na terça-feira (25.08), JLo, como é conhecido em Angola, foi confirmado como candidato único à presidência do MPLA no VIII congresso do partido, agendado para dezembro de 2021.
O politólogo David Sambongo critica a falta de abertura a outras candidaturas: “O MPLA, enquanto partido no poder e que detém uma grande parte da elite política deste país, devia dar o exemplo, até porque os contextos são outros, [e devia permitir] que outras figuras do partido concorram em pé de igualdade com o general João Lourenço”, argumenta.
Apesar da consolidação de João Lourenço no poder, para o cidadão Bento Bernardo, uma coisa é certa: o ex-Presidente José Eduardo dos Santos jamais será esquecido: “Falo de José Eduardo dos Santos, Jonas Savimbi, Holden Roberto – todos eles líderes que marcaram a História”, conclui.